Heróis da Relva fecham o país

Category: By Luís Peres

Sendo eu um viseense de nascimento e residência, não podia deixar de fazer um pequeno comentário ao jogo que se irá realizar no Estádio do Fontelo, no dia 31 de Maio. A cidade está doida, completamente doida. Vê-se verde e vermelho por tudo o que é sitio, vestidos de noiva com as caras dos jogadores da selecção, bandeiras nas varandas, empelastros estacionados 24 horas por dia em frente ao Hotel Montebelo, carros de reportagem por todo o lado, agentes da autoridade a interromper o trânsito para uma elite desportiva chegar mais depressa onde precisa... 
A verdade é que o futebol, correndo o risco de ser corrido a pontapé (passe-se a ironia), tem tomado proporções estupidamente desastrosas e dominantes na nossa pequena sociedade semi-conservadora que de vez em quando vira quase liberal.  Então, o problema não afecta só a cidade, obviamente. O país todo está hipnotizado pela cidade jardim de Viriato, mas ninguém se lembra nem dele nem de Grão Vasco: as atenções estão todas viradas para celebridades que, supostamente, dão uma boa imagem de Portugal ao mundo. Cristianos Ronaldos, que tão bem sabem falar e opinar, são verdadeiros ídolos da juventude nacional, enquanto que os Josés Saramagos ou um qualquer capitão de Abril são esquecidos, tornados personagens míticas e inalcansáveis. O que interessa é receber rios, mares e oceanos de dinheiro apenas por chutar numa bola em jogos ocasionais. 
O auge desta corrente de maluqueira e de insanidade é alcançado nos telejornais. Três quartos dos pseudo-informativos são dedicados ao futebol e aos treinos (é que nem é o jogo, são os treinos) enquanto que o resto das notícias (menos importante, obviamente) são encurtados, resumidos e reduzidos a um quarto do tempo de antena. Tempo de antena esse que, infelizmente, é o menos visto. "O futebol já acabou? Vamos ver a telenovela". O país está despreocupado e uma sociedade desinteressada é o impulso para o deboche dos valores que realmente interessam, correndo o risco de me parecer com um conservador. As pessoas sérias têm de fazer ver às menos sérias que isto está errado. Vivemos actualmente uma crise mundial alimentar, de combustiveis, económica, imobiliária que ameaça generalizar-se a todos os sectores da vida e do quotidiano. Mas em vez de estarmos atentos a estas situações, estamos a ver corpos jeitosos com umas ricas pernas a dar pontapés numa coisa redonda de tecido ou então uns quaisquer seios avantajados e uma derrière agradável à vista. A sociedade está louca num mau sentido. O juízo está no esgoto. Os valores perdem-se. A crise continua. Nós não damos conta de nada... Só do quão negro está o bigode do Dr. Fernando Ruas enquanto se vangloria pelas televisões a falar de futebol.
 

7 comments so far.

  1. Anónimo 29 de maio de 2008 às 20:22
    Olá. Olha, antes de mais, os meus parabéns pelo bom post, está mais que na altura de esse facto ser constatado, mencionado e debatido.
    Pessoalmente, já o fiz muitas vezes com colegas de turma e, apesar de na generalidade haver uma concordância de que é dada demasiada importância ao futebol (quer na tv, quer pela imprensa, quer a sociedade em geral). Mas sim, é triste que a maioria das pessoas nem saiba quem Teófilo Braga foi. Mas se lhes perguntares com quantos pontos de avanço vai clube a de clube b, a maioria responde-te rápido e com exactidão.
    É como há dias vi na televisão, numa série, certa personagem dizer "os EUA estão em guerra e tudo o que a população quer saber é se o Brad e a Angelina são mesmo um casal". Tal como os EUA, Portugal tem as suas prioridades todas trocadas.
    Sim, há uma perda enorme de valores... mas calma, que o português típico virá em salvação da pátria, com os seus ideais racistas, homofóbicos, machistas e xenofóbicos, e os outros aplaudem a resposta dele. "Ah, quero lá saber de Literatura, quero é chegar a casa, sentar-me no sofá, ver a minha mulher trazer-me a cerveja enquanto eu vejo uma partida de futebol" e todos concordam, aplaudem. "Ah, homem que não vê futebol não é homem", diz a maioria, e os outros riem e apoiam. Decadente? Talvez. Mas também, nunca fomos uma nação grandiosa - ou, quando o fomos, foi através de actos repugnantes como a escravatura. Uma pena, meu Portugal...

    Abraço
  2. Anónimo 29 de maio de 2008 às 20:52
    Olha é assim, eu pessoalmente odeio o desporto, e acho EXAGERADO e INDECENTE que se dê tamanha importância ao desporto em vez de assuntos que realmente importam!! Talvez a única coisa de boa que o futebol portugues possa trazar ao país é o sentido de patriotismo que falta em Portugal, mas de resto... enfim.
    Faltem ao trabalho e à escola para ir a Viseu, percam a cabeça ou colem-na à televisão, continuem que vão no bom caminho...
  3. Sandra Esteves 29 de maio de 2008 às 20:59
    Eu cá acho o futebol um desporto engraçado e saudável. É giro ver futebol, eu gosto. Mas sabem uma coisa? EXISTEM OUTROS DESPORTOS! (E o pai natal não existe!), e como tal não vejo justificação para tal importancia a este, que nem é dos mais interessantes. Não tenho nada contra o desporto, mas acho que tudo deve ter o seu equilíbrio e isto é como a bebedeira. Sim, não me venham cá os "não-me-toquem" dizer "ai eu sou muito rico, muito chique, muito civilizado, isto nao é como a bebedeira", mas é. É DEMAIS! Vivam as coisas, eu propria vou ver os jogos, mas nem 8 nem 80! Para pensar em que lugar Portugal vai no futebol estão todos prontos, mas para saber lugar em que Portugal vai na lista dos mais poluídos... "deixa-me ir comer um bitoque".
    Só mostram ignorancia.

    E já agora, o jogo não tinha nascido se não fossem os Chineses e os Japoneses, por isso, quando forem a caminho do estádio, não sejam xenofobicos ;) Mostrar ainda mais ignorancia... é um bocado... oh esqueçam, a bebedeira já foi referida!

    Bons Jogos,
    Sandra Esteves
  4. Raul Martins 31 de maio de 2008 às 12:51
    Sou um defensor do desporto como prática saudável e forma de ajudar a incutir certos valores aos jovens. Tenho um filho que é federado de Andebol e uma filha que se dedica à natação. Mas fiquei muito agradado com esta reflexão do poste aqui colocado.
    Não vou estar aqui a repetir-me sobre várias aspectos que falas no texto, apenas acrescentaria a crise na educação, escolar e familiar, dos nossos jovens que é uma das principais causas da crise de valores que falas.
    Parabéns pelo teu blogue. Voltarei mais vezes.
  5. Joao Peres 3 de junho de 2008 às 21:18
    Concordo com tudo o que dizes...
    Na minha opinião não podes é retirar importância aos portugueses que representam a selecção nacional.Nem todos podem ser Saramagos.Estes portugueses apesar de não serem cultos e de terem valores e gostos diferentes dos teus, não quer dizer que sejam pessoas menos sensíveis ao estado em que o mundo se encontra!Eles têm a sua importância, e poderão ficar na história tal como Grão Vasco!
    O futebol será sempre o ópio do povo quer tu queiras quer não! e tal como um capitão de abril o cristiano ronaldo será esquecido por aqueles que não se interessam por desporto, apesar de ser motivo de orgulho para qualquer potuguês! É simplesmente o melhor do mundo e uma referência no desporto.
    Achas que isso se consegue porque se dá uns "chutos na bola"? Então enganas-te.Consegue-se com trabalho diário, sacrificio, vontade, atitude, horas extraordinarias de treino e fazer os possiveis e impossiveis para melhorar! Talvez os teus "amigos políticos" deveriam pôr os olhos na humildade de uma pessoa que começou a trabalhar desde os 7 ou 8 anos na academia do sporting para atingir o objectivo de ser o melhor do mundo! Por tudo isto acho que deverias repensar a tua arrogância em relação ao mundo do desporto! Se os polícos fizessem o seu trabalho tão bem como o cristiano ronaldo faz o dele, acredita que viviamos quase num "mundo cor-de-rosa".
    Desculpa se te ofendi, n era a minha intenção, mas acho que foste extremamente injusto neste comentário!
    Beijo do teu irmão desportista :P
  6. Luís Peres 3 de junho de 2008 às 23:03
    Claro que não era tua intenção, como não era a minha ofender qualquer praticante de desporto. Claro que nem todos podem ser Saramagos, quem me dera a mim ser um. Mas se calhar devia haver um esforço maior pela parte da maioria para conseguir ter uma cultura não-desportiva algo mais desenvolvida (o Cristiano Ronaldo tem lido alguns livros, vi na entrevista, louvo-o). Se as pessoas não forem cultas, nunca serão completamente sensiveis às situações adversas que o mundo atravessa porque não conseguem saber porque razão a situação é a que é, não fazem ideia como ajudar para a resolver e como não estão integrados no que disse agora, deixam de se interessar. Claro que ficam na história, o Eusébio já ficou. E têm a sua importância sim, mas do que falo é das proporções rídiculas da sua importância. Dizes que será o ópio do povo, usaram esse termo na religião renascentista e inquisitorial. Não me parece que ópios sejam positivos. Um capitão de Abril contribuiu que agora possamos estar aqui a escrever isto, um jogador de futebol dá-te momentos de orgulho de curta duração. Sim, trabalham, eu exagero e sabes que o faço, mas as hipérboles são óptimos recursos estílisticos. Em relação à maneira como foste irónico em relação a qualquer pessoa ligada à política, não me parece lá muito correcta, mas tenho a certeza que tens as tuas razões. E tal como essa pessoa que começou aos 7 para atingir o objectivo de ser o melhor do mundo, também qualquer outro profissional tem de se intruir na sua área desde cedo e aculturar-se.
  7. Joao Peres 4 de junho de 2008 às 00:40
    ora...ta tudo dito! cada um na sua àrea a desempenhar o seu papel o melhor possivel. Assim, de certeza isto melhora!

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